quarta-feira, 5 de maio de 2010

A paisagem brasileira



O historiador Sérgio Buarque de Hollanda nos leva ao espanto em seu livro “Visões do Paraíso” , pois nos faz saber que as terras desconhecidas ao sul do Equador faziam florescer na mente daqueles homens do século 16 visões idílicas do paraíso terrestre, identificado com estas terras, ou seja, com o Brasil. É difícil convencer quem chega ao Rio de Janeiro pela Baixada Fluminense ou quem sai do aeroporto de Guarulhos e vai pela Marginal do Tietê, em São Paulo, de que o paraíso terrestre é aqui. Mas era diferente há quinhentos anos. As imagens do paraíso mesclavam-se com gravuras feitas por europeus que estranhavam as novas terras tropicais e se assustavam com os bichos, as plantas e o relevo.

O francês André Thevet acompanhou a expedição de Villegagnon (1555) ao Brasil e desenhou animais e seres humanos bestializados que comportam os adjetivos de estranho, exótico ou até mesmo monstruoso como a “ave de bico tão grosso e comprido como o resto do corpo” e relatos explicativos de um animal que mais parece um alienígena mas que na verdade é o bicho-preguiça. Um outro francês, Jean de Léry, conviveu um ano entre os tupinambás e também participou da mesma expedição de Thevet. Sua visão da terra era diferente na medida em que representava os nativos de uma forma apolínea, corajosa e bela, um tipo de “bom selvagem”. Mas um dos mais famosos relatores das belezas brasileiras foi o holandês Hans Staden, fundador de nossa literatura de viagem e que influenciou os viajantes dos séculos 16 e 17.

Mas é na passagem do século 16 para o século 17 que as formas, cores e volumes das ilustrações tornam-se ainda mais fantásticos e plenos de sonhos para descrever as delícias e os perigos das novas terras. “O olhar lançado pela cultura européia para a terra e para o índio americano os reconstrói enquanto objetos do desejo e da cobiça. Um misto de curiosidade e impulso de conhecimento...” (Belluzzo, vol. I, p. 88). O esplendor fica explícito nas obras de Albert Eckhout (1642), ao retratar os ricos traços étnicos dos negros africanos e dos nativos brasileiros, e nas telas de François Desportes, retratando os mamíferos, aves e peixes com cores vivas e que posteriormente seriam utilizados em tapeçarias. Entre estas as mais impressionantes tessituras são as de Manufacture des Gobelins onde a fauna, a flora e o ser humano nativo interagem em uma estética dinâmica e gloriosa. O país começa a adquirir um “pathos” estilístico no imaginário popular a partir destas obras forjadas nos dois primeiros séculos da colonização. O mestre holandês Eckhout elaborou também uma série de naturezas mortas onde retrata outras das delícias brasileiras: flores e frutos. As imagens de fartura, exotismo e sensualidade do gosto permeiam as telas e marcam o tom da futura gastronomia exuberante dos trópicos.

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